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4 Poemas de Auta de Souza

 Falando ao Coração Auta de Souza


A Generosa Pinheiro


Desperta, coração! vamos morar

N’uma casinha branca, ao pé do Mar...

Que seja linda como é linda a Lua

Que em noites santas pelo Azul flutua:

Imaculada como a luz do Amor,

Alva de neve como um sonho em flor.


Quando a Noite vier... se no meu seio

Estremeceres cheio de receio,

- Tremendo a sombra que amortalha o Dia

E cobre a terra de melancolia, -

Longe do mundo e da desesperança,

Hei de embalar-te como uma criança.


Quero que escutes o gemer profundo

Do Mar que chora a pequenez do mundo

E ouças cantar a doce barcarola

Da noite imensa que se desenrola,

Dando perfume ao coração dos lírios,

Trazendo sonhos para os meus martírios.


E quando o Sol nascer; quando, formosa

Como uma garça branca e misteriosa,

Batendo as asas cor de neve, a Aurora

Vier cantando pelo mundo a fora,

Rufla as asas também... e forte, então,

Tu podes palpitar, meu coração!


Acorda para a Vida e canta e canta,

O Sol da Terra - iluminada e santa!

Deixa o teu sonho de saudade e dores

Dormir no seio trêmulo das flores...

E foge e foge pelo Espaço, à toa,

Pomba exilada que a seus lares voa!


Esquece a louca e pálida amargura

Que há tantos anos meu viver tortura...

Canta o teu hino de ilusão querida,

Esquece tudo o que não seja a Vida,

E, para o Céu das alegrias mansas,

Conduz nas asas minhas esperanças...


Não vês? Minh’alma é como a pena branca

Que o vento amigo da poeira arranca

E vai com ela assim, de ramo em ramo,

Para um ninho gentil de gaturamo...

Leva-me, ó coração, como esta pena

De dor em dor até à paz serena.


Desperta, coração, vamos morar

N’uma casinha branca, ao pé do Mar...

Quero que escutes, a sonhar comigo,

A queixa eterna do Oceano amigo

E ouças o canto triunfal da Aurora

Batendo as asas pelo Mar a fora...


Barro Vermelho.

De joelhos

Auta de Souza



A Maria da Glória Penna


Ajoelhada, ó minh’alma, abraçando o madeiro

Em que morreu Jesus, o teu celeste amigo!

A seus pés acharás o pouso derradeiro,

O derradeiro amparo, o derradeiro abrigo.


Ajoelha e soluça... A noite, mãe piedosa,

Te aperta contra o seio e te ensina a rezar...

Balbucia a oração, pequenina e formosa,

Das estrelas no céu e das ondas no Mar.


Ajoelha e soluça, implorando a alegria

Que a saudade sem fim do coração te arranca,

E a graça de viver, como a Virgem Maria,

Eternamente pura, eternamente branca.


Ajoelha e repete a prece imaculada

Que aprendeste a rezar no tempo de criança;

Deixa a prece subir como uma ária encantada

Se evolando da terra ao País da Esperança.


Ajoelha e soluça... A dúvida, que importa?

Ninguém poderá rir ante uma dor tamanha...

Todos beijam a Cruz, toda a descrença é morta

Quando se chega ao pé da sagrada montanha.


De joelhos, minh’alma, ao pé do lenho santo

Em que sofre Jesus a derradeira pena!

Deixa cair-lhe aos pés em gotas o teu pranto...

Que as enxugue no Céu a doce Madalena!


Ajoelha e soluça, implorando a alegria

Que a saudade sem fim do coração te arranca,

E a graça de viver, como a Virgem Maria,

Eternamente pura, eternamente branca...


Serra da Raiz - 2 - 1898

Ao Cair da Noite

Auta de Souza

A Maria Emília Loureiro

Não sei que paz imensa
Envolve a Natureza,
N’ess’hora de tristeza,
De dor e de pesar.
Minh’alma, rindo, pensa
Que a sombra é um grande véu
Que a Virgem traz do Céu
Num raio de luar.

Eu junto as mãos, serena,
A murmurar contrita,
A saudação bendita
Do Anjo do Senhor;
Enquanto a lua plena
No azul, formosa e casta,
Um longo manto arrasta
De lúrido esplendor.

Minhas saudades todas
Se vão mudando em astros...
A mágoa vai de rastros
Morrer na escuridão...
As amarguras doidas
Fogem como um lamento
Longe do Pensamento,
Longe do Coração.

E a noite desce, desce
Como um sorriso doce,
Que em sonhos desfolhou-se
Na voz cheia de amor,
Da mãe que ensina a Prece
Ao filho pequenino,
De olhar meigo e divino
E lábio aberto em flor.

Ah! como a Noite encanta!
Parece um Santuário,
Com o lindo lampadário
De estrelas que ela tem!
Recorda-me a luz santa,
Imaculada e pura,
Da grande noite escura
Do olhar de minha mãe!

Ó noite embalsamada
De castas ambrósias...
No mar das harmonias
Meu ser deixa boiar.
Afasta, ó noite amada,
A dúvida e o receio,
Embala-me no seio
E deixa-me sonhar!


Ao Clarão da Lua

Auta de Souza

A Meu Irmão Eloy

O LÍRIO
Lá nas alturas, modesta e loura,
- Do Céu imenso na face nua -
A lua branca todo o Azul doura...

A NUVEM
Ah! se eu pudesse mudar-me em lua:

O PERFUME
E aquela estrela, tão pequenina
Que mal a gente consegue vê-la,
Como cintila, casta e divina!

A LUA
Ah! quem me dera ser uma estrela!

A NUVEM
O lírio branco, cheio de orvalho,
Invoca a lua no seu martírio
E doce e triste treme no galho...

A ESTRELA
Ah! quem me dera ser como o lírio!

O CÉU
Perfume doce bóia nos ares...
Virá nas asas de um vaga-lume?
Será da terra? Será dos mares?

O ORVALHO
Ah! quem me dera ser o perfume!

O POETA
Terno instrumento suspira ao longe
Numa cadência melodiosa...
Será na cela piedoso monge?

UMA CRIANÇA (sonhando)
Ah! quem me dera ser uma rosa!

A NOITE
O sonho vive dentro em meu seio,
Garrulo e meigo, doce e risonho,
Cheio de luzes, de aurora cheio...

O PERFUME
Ah! quem me dera ser como o Sonho!

A MADRUGADA (ao longe)
Ouvem? As aves já vêm cantando,
As estrelinhas tomam seu véu...
É tempo de irmos também chegando...

O CORAÇÃO
Ah! quem me dera subir ao Céu!

Janeiro de 1897.

Ao Clarão da Lua, de Auta de Souza
Veja também

Auta de Souza foi uma poetisa brasileira da segunda geração romântica. Quando tinha doze anos, vivenciou nova tragédia: a morte acidental de seu irmão mais novo, Irineu Leão Rodrigues de Sousa, causada pela explosão de um candeeiro (Wikipedia)


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João 3 16 Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho Unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna.